O que vai ter de gente falando pelas tripas do judas que eu só reclamo, não vai ser fácil, mas preciso desabafar antes de enlouquecer.
Isso que está no meu peito vai me deixar pior se eu não botar para fora.
São muitos milhares de mortos no meu país, homens, mulheres, crianças… gentes de todas as idades.
E mesmo com uma lista telefônica diária de falecidos, ainda ouço idiotas que não sabem escrever duas palavras sem errar três, coisas como: “Agora só morre de covid”.
Então vem a vontade de gritar muito com essas pessoas, porque a burrice delas me enoja.
Porque o achismo delas me cansa mais do que andar de máscara no meio desse calor do inferno.
São muitos milhares de mortos no meu país.
Muitos médicos, enfermeiros e coveiros cansados de tanto trabalhar, e ainda temos os idiotas dizendo: “mas e se a gente falir”?
Então dá vontade de gritar que se todos morrerem, isso não importa, porque não vai ter nada pra comprar, vender e dinheiro não vai valer nada mesmo.
No meio de uma pandemia, que caso vocês não saibam o significado é “epidemia mundial”, vemos muitos lutando por coisas importantes, como alimentação e saúde para a maioria.
Enquanto isso, no meu país, que é o com maior número de mortes per capita, você vê serviços essenciais aumentando seus preços abusivamente, enquanto as pessoas nem têm mais trabalho para ganhar dinheiro e pagar.
Vemos o pão valendo 1 real e a pessoa te oferecendo 2 reais para fazer um trabalho que custa pelo menos 10.
Essa conta fecha? Acho que não.
Mas, em meio a uma crise sanitária, humanitária, social, econômica, temos uns loucos que apostam em um golpe, que já foi dado há anos, mas que ninguém quer reconhecer a participação.
Porque isso seria a grande tragédia de reconhecer o próprio erro!
E nesse momento eu pergunto: vocês realmente acreditam que reconhecer seus erros vai tirar algum poder de vocês?
Acreditam que massacrar pessoas que já não têm nada dá a vocês algum tipo de suporte?
Vou responder com uma frase que usei na campanha de Itaquá em 2012: “vocês, moscas, terão o poder sobre esse monte de estrume”.
Porque é isso que esse país virou. E a gente continua se virando.
Meu desânimo total vem do fato de que não consigo fechar os olhos para tudo o que acontece à minha volta.
A violência não está só nas redes sociais, nos jornais, na TV. Está no meio de nós.
Ontem tirei uma foto de um caminhão parado em frente ao ponto de ônibus, embaixo de uma placa com um enorme E cortado por um X.
Isso significa que ele não deveria nem parar ali, quanto mais estacionar.
O que eu queria quando fotografei? Que o distinto se mancasse e saísse daquele local, onde, aliás, havia duas pessoas aguardando o ônibus.
O que eu ganhei?
Um motorista enlouquecido me ameaçando aos gritos e ninguém fazendo nada.
Ah sim! Tinha mais gente ali vendo a cena.
E aquele pequeno microcosmo me deu a noção do macrocosmo. Ninguém liga se não for consigo.
Eu nem sei se liga, já que deve sempre ter alguém que teve morte violenta na família.
É isso que chamam de humanidade? Se é, em algum lugar o caminho desviou.
Então, mesmo que muitos tenham me aconselhado a relevar, a não denunciar (o que eu ainda não decidi), cansei de me calar e continuar vivendo e respirando como se nada tivesse acontecido.
No primeiro semestre de 2020, 648 mulheres foram mortas no Brasil por motivos ligados a gênero.
Estou ouvindo as pessoas perguntando: “só isso”? E vou responder: Que número é “confortável” pra vocês?
Eu fui ameaçada ontem. Minha irmã morreu há 38 anos assassinada pelo ex-namorado.
Quantas mulheres foram mortas ou ameaçadas sem que ninguém levantasse um dedo em defesa delas?
Estou desanimada e sufocada, mas garanto que não é a máscara. Não sei direito o que é.
Talvez saber que há milhares de pessoas sem emprego, sem casa, sem ter o que comer, sendo ameaçadas todos os dias e não só no Brasil.
Nesse momento, eu quero perguntar aos gênios que gostam de vomitar seus comentários sem noção: se não conseguimos resolver nem um problema que vocês acham pequeno, o que dirá dos problemas grandes?
E me sinto mais desanimada, porque não vejo alguém nem mesmo tentar.
E por favor, não me venham com a conversa de que a gente precisa “engolir sapos”, porque vocês não são os únicos a fazer isso.