Sábado, para mim, foi o dia das crianças.
Não o dia mesmo, o comercial, que a gente dá presentes etc.
Também não é o dia de Cosme e Damião, sempre associados aos ibejis e erês, em que a gente dá doces e faz festas e brincadeiras.
Este sábado (28 de setembro) foi um dia que teve tudo isso, mas foi uma maneira de dar às crianças uma tarde de lazer.
Foi o dia em que encontrei de novo minha criança, aquela que brincava descalça nos terrenos baldios com os amiguinhos.
Então foi o dia de ver que criança não precisa de muito para seus olhos brilharem de alegria.
Dia de dançar, correr, brincar e esquecer que o mundo lá fora é malvado.
Estamos vivendo a maldade do homem crescido, que quer provar que tem mais poder e assim, destrói.
E neste sábado eu redescobri o significado de uma canção de Taiguara, “Que as Crianças Cantem Livres”.
Por um momento, durante uma atividade que comemora os 41 anos do Projeto Meninos e Meninas de Rua, eu voltei à minha própria infância.
Lembrei das brincadeiras nos terrenos baldios da Vila Moraes, Planalto, vila Marlene e mais.
Olhei os olhos brilhantes daquelas crianças, encantadas com alguns números de circo.
Eu me vi de novo, menina… quando a gente brincava com todos da rua, sem importar se a cor ou status social eram diferentes.
E não creio que as coisas mudem se as crianças não forem contaminadas pela maldade do adulto.
Sábado passado a Rita de 63 anos voltou a ter uns 6 ou 7 anos.
Lembrando das molecagens que fazia com minhas irmãs e meu irmão.
E como a gente era marrento.
Foi uma infância de pobreza, mas a gente se divertia com pouco.
Tínhamos hora até pra ver desenho na TV.
E sempre era depois de tirar o uniforme, almoçar, lavar louça e fazer a lição de casa.
Nem vou dizer que a gente fazia de má vontade, mas correndo.
Quanto mais demora, mais atraso pra brincar fora de casa.
Não tinha celular hipnotizante.
Aliás, uma única criança nos pediu senha de wi-fi. Mas não durou muito…
A criança preferiu correr com os amigos.
Lembrei de um ditado que dizia que o melhor brinquedo para uma criança é sempre outra criança.
No sábado, vi os olhos brilhando, os risos correndo soltos, e o mundo perverso que mata crianças longe de nós.
Desejei por um momento colocar todas as crianças do mundo dentro do Projeto, como se eu pudesse afastar delas, para sempre, a violência do mundo lá fora.
Sei que é uma utopia, mas essa é a minha utopia.
No sábado eu voltei à minha infância, onde tínhamos também violência e tragédias.
Infância regada a guerra do Vietnã e ditadura militar.
Hoje as violências estão em genocídios na palestina, Líbano, partes da África e aqui no Brasil.
Violência nos morros, nos remotos interiores, em todas as partes se olharmos bem.
Sei que violência sempre há, mas isso só continuará se nós perdermos a criança em nós.
Ou ainda se normalizarmos essas violências justificando a guerra, a fome, o abandono.
Em tempo: fui juíza num concurso de dança das crianças, e ganhei o abraço mais amoroso do mundo de um garoto corintiano.
Isso me fez ter alento na vida.