Hoje minha única receita é para o desastre
O dia amanheceu em catástrofe, ao menos para mim.
O Museu Nacional do Rio de Janeiro foi consumido pelo fogo e de todo o acervo inestimável sobraram 10%.
Muitos irão questionar o porquê chamo isso de catástrofe.
E eu explico:
Em um país que dá importância muito pouca a arte, educação e cultura, a perda de um só museu é como matar o últimos espécime de algum animal.
Mas a minha lamentação não é apenas pela perda de acervo, ou a queima de um dos prédios mais belos nos quais já pus meus pés andarilhos.
Antes de mais nada, é a certeza de que para mais de 90% da população isso não importa.
Para um sem número de pessoas o que aconteceu é algo como: “queimou umas velharias”.
Então, entendam:
É difícil e solitário viver cercada de pessoas que acham uma perda de tempo guardar um quadro raro.
Doloroso saber que pessoas à minha volta não se importam com uma escultura encontrada em uma escavação.
Não se importam com móveis, roupas, livros.
Eles preferem bater no peito e dizer que nunca foram a um museu.
São gente que lê um livro de frases motivacionais vazias, mas é incapaz de discutir filosofia, porque é “perda de tempo”.
Gente que acredita que poesia é rimar amor com flor, ou dizer que a dor é uma “sofrência”.
Hoje estou triste demais.
Não é apenas um prédio que queima.
É o conhecimento humano guardado por 200 anos naquele local que queima.
É o país que, não contente em destruir o futuro, queima o próprio passado e nem se importa com isso.
São só umas velharias.
Não sei se consigo continuar a viver respirando esse ar.
O que me resta, por enquanto, é lamentar.
O Museu Nacional se foi.
Espero que mais nada se vá.
Mais ainda eu espero.
Espero que as pessoas deste país entendam tudo o que se perdeu hoje…
A historiadora em mim está de luto.
Assim como estão de luto todos aqueles que entendem que perder isso é perder um pouco mais a humanidade.
E este é o meu lamento.