Abrir o coração em tempos de solidão


Nessa meleca de pandemia que nos atingiu bem na cara, muitas são as medidas de precaução. Não tocar, ficar longe; sair apenas se necessário; muita limpeza e muito asseio. Mas deveria haver outras especiais, para nos dizer o que fazer com a solidão.

Querem saber? Mesmo que o ato de escrever ou ler seja solitário, a interação mínima é necessária. Mas não qualquer interação. Não serve um estranho (a) educado. Não vale alguém na fila do mercado. E definitivamente, não serve aquela pessoa que não entende o que você fala, ou aquela cuja única resposta é a agressão pura e simples.

Veja bem, não sou nenhum gênio cheio de respostas. Há vezes em que duvido de qualquer talento meu, porque se eu tivesse isso não seria tão difícil viver, sobreviver, aturar, não sufocar. Mas há horas que vejo e ouço pessoas que só vomitam palavras que apenas são os ecos de seus próprios preconceitos e isso me deixa muda, porque sei que se eu responder o que virá de volta é uma agressão.

O argumento de quem não pensa e não tem argumento é a violência. Verbal, física, psicológica.

Com esse panorama pandêmico, tenho evitado interações com as pessoas do meu bairro, que já não são as melhores em tempos de paz, que dirá em tempos nos quais tudo o que vemos é um jogo de poder inútil, de um querendo mostrar que o “seu é o melhor”. Puro jogo de briga entre os moleques da rua de baixo com os da rua de cima. Não importa! O campinho de futebol que gerou a disputa não existe mais. É hora de parar a briga.

Mas parece que ninguém quer parar. Porque acreditam que é mais importante que seu lado vença, mesmo que seja o lado errado, ou que não tenha lado certo. Certa vez, trabalhando em uma eleição numa cidade que tinha mais problemas que soluções possíveis, pensei comigo que aquelas pessoas na disputa eleitoral estavam brigando sobre um cadáver feito animais carniceiros. É o que vejo agora e por isso meu isolamento está maior que nunca.

Não é medo do Corona vírus. Não tenho medo de morrer, mas tenho medo de viver em um mundo que não muda, perto de pessoas que não evoluem, que não aprendem com os erros, que persistem na mesquinharia. Tenho lido muitas frases otimistas para levantar a moral em tempos difíceis como esses, mas confesso que estou em uma grande crise de fé. Posso até ouvir dizerem que Deus nos sustenta, mas acho que ele tem coisa mais importante para fazer do que olhar para minha pequenez.

Como muitas pessoas estou fragilizada, sem saber o que vai acontecer depois que isso passar. Não sei o que será de nós amanhã. Gostaria que as pessoas pensassem mais no coletivo do que no individual; que vissem que toda vida importa, mesmo que esteja do outro lado do planeta; que não importa se é jovem ou idoso. Não é só o vírus que mata. A ignorância também, e a ignorância é mão da violência. Não sei se quero mais viver em um mundo assim.

Ontem, por alguns momentos e após uma luta com a tecnologia, conversei com partes da família em vários pontos de São Paulo e Rio de Janeiro. Agradeci por termos essa oportunidade de nos ver, falar e saber que estamos bem. Rezo para continuar assim. Mas logo que a videoconferência terminou me veio uma dor muito grande de saber que mesmo com toda a tecnologia eu não posso abraçar e beijar os meus queridos familiares e amigos. Não neste momento. E depois pensei em todos os que estão perdendo pessoas amadas e que não estão sequer podendo se despedir deles.

Sei que tudo vai passar e rezo para que passe logo, mas não sei se quero estar aqui para contar os despojos. O Corona Vírus será morto, mas esse ódio sem razão, será?

 

 

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5 respostas para “Abrir o coração em tempos de solidão”

  1. Nós amiga como muitas outras que gostam do abraço amigo do carinho… Tecnologia não serve… enquanto muitos só se falavam por gosto pelo whats e outros nós nunca gostamos… Agora infelizmente somos obrigados a isso… sinto falta do cheiro do carinho dos amigos

  2. Oi, eu penso que assim que passar o vírus vai ser muito pior. Me explico: amigos meus circulam lindos vídeos falando sobre como o mundo está mais limpo, como as famílias estão convivendo mais e quantos gestos nobres têm acontecido e como estão sendo filmados para dar às pessoas novas esperanças de um mundo melhor. Outros citam a Bíblia, o Apocalipse e alertam sobre o 1º Cavaleiro do Apocalipse, a PESTE. Mas que Jesus vai voltar e salvar os justos… Quem não se acha justo? O milionário tem dinheiro pela inteligência dele; o rico trabalhou dia e noite para ter o que tem; o empresário dá empregos; o trabalhador se doa para a empresa; o pobre nunca teve chance…
    Mas ninguém tem passado videos das brigas familiares, da violência contra as mulheres, da impaciência com os filhos, com os empresários que estão falando “Se vc tem dinheiro agora APROVEITA pq tem várias pechinchas pq tem um monte de gente quebrando!”
    Quando o Covid19 passar vai sobrar: uma leva de profissionais da saúde arrasados e exaustos, famílias acabadas por mortes de idosos e dos corajosos, ricos oferecendo esmolas para os que sobraram que vão aceitar trabalhar por um prato de comida.
    Não vai haver renascimento, não vai haver a volta de um santo, não vai haver a conscientização de que temos que cuidar do planeta. Só vai haver a cristalização da máxima: o mundo é dos fortes.

  3. infelizmente é assim mesmo que eu vejo. As pessoas que mandam os vídeos enaltecedores só estão pregando para os convertidos. Aqui vejo pessoas fazendo coisas más só para arreliar os outros. como eu disse, gente que se acha acima do bem e do mal. EE minha fé não é o bastante para esperar a justiça. E, não. Não tenho dinheiro para torrar agora nem depois

  4. Infelizmente essa não é a principal questão desse post. Sim, abraço é importante, mas não é o bastante quando os corações estão áridos